O Bloco

Maracatu é festa de força e trabalho coletivo, zoada de tambores graves movendo a energia “das senhoras e dos senhores da natureza” que, tirando os corpos de lugar dá novos sentidos a vida de quem participa. A zoada encantou e deu vida ao Maracutaia, foi brincando Maracatu que as conexões se estabeleceram e, buscando como (re)existir na cidade, assim como em terras pernambucanas, colocamos o bloco na rua.

Criado em 2005, o Grupo Maracutaia foi formado inicialmente por alunos do Rio Maracatu – bloco pioneiro no maracatu do Rio de Janeiro – que, apaixonados pelo ritmo, inventaram mais motivos para tocar e dançar, realizando ensaios na Lapa e no Aterro do Flamengo. Esses encontros resultaram no primeiro desfile de carnaval, em 2008, nas ruas de Santa Teresa, bairro com grande vocação carnavalesca, onde muitos integrantes ainda moram. 

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A partir de 2012, os desfiles e ensaios passaram a acontecer nas praças e ruas do Centro, sempre se adaptando às constantes mudanças da cidade, entre os meses de setembro e março, dependendo da data do carnaval em cada ano. O desfile, toda segunda feira de carnaval, já faz parte do calendário e da história afetiva do Centro do Rio de Janeiro, colaborando com um carnaval espontâneo e plural que valoriza os mestres e grupos populares espalhados pelo Brasil. 

Regida atualmente por Lina Miguel, Jessica Oliveira e Pedro Prata, a bateria do bloco se constrói a cada carnaval, reunindo velhos e novos batuqueiros que se revezam entre alfaia, caixa, gonguê, agbe e ganzá, incorporando outros instrumentos, dependendo da Nação, como o timbal no Porto Rico. O compartilhamento de instrumentos, incluindo o apito, é parte central no processo e, fazendo a ponte entre as alfaias – instrumento simbolo e coração do maracatu – e o corpo de dança, a ala coreografada de agbês se destaca, preenchendo os intervalos rítmicos e dando continuidade ao movimento que costura o bloco. 

 A criação de blocos com ritmos e referências de outros estados ou regiões do mundo, é um fenômeno que vem acontecendo há pelo menos vintecinco anos no Rio de Janeiro, o Maracutaia fazendo a ponte Rio/Recife sempre percorreu os diferentes sotaques e instrumentações das Nações de Maracatu que, assim como as escolas de samba são reconhecidas e diferenciadas por sua forma singular de tocar. Estrela Brilhante, Leão Coroado, Porto Rico, Encanto da Alegria, Almirante do Forte e Estrela Brilhante de Igarassu são algumas Nações tocadas e reverenciadas pelo bloco. 

A partir de experimentações rítmicas e de movimento, o grupo passou a compor arranjos e toadas que mesclam essas referências, desenvolvendo, aos poucos, seu próprio sotaque e estética. Parte desse repertório autoral está gravado no ep de “Toadas do Maracutaia”, lançado em 2021.

O mesmo acontece com o corpo de dança, dividido em alas com catirinas, velha guarda e porta estandarte que, sob o direcionamento da bailarina Laís Salgueiro, desenvolve um trabalho corporal e coletivo com base nos repertórios de movimentos tradicionais e estilizados da dança do Maracatu, buscando não reproduzir a corte dos grupos tradicionais – que possuem outras alas e elementos, como Rei e Rainha e a Calunga (boneca de cera que representa os ancestrais e os orixás de cada Nação) -, mas também refletir, no trabalho da oficina Danças e Expressões, a necessidade de um diálogo ativo entre as emergências do coletivo e os ensinamentos transmitidos pelos mestres. 

A confecção de adereços e estandarte são bons exemplos dessa construção coletiva a partir de conhecimentos cultivados no grupo ao longo dos anos. A velha guarda e o estandarte, alas majoritariamente negras, trazem seus saberes em indumentária e adereços com Sandra Oliveira, Vall Neves e Suel Biette para compor a estética visual do bloco todo. Na busca pela resposta sobre “O que é fazer Maracatu na cidade do Rio de Janeiro?” temos encontrado, nos últimos anos, uma organização própria, a partir de alas que se diferenciam entre si por seus figurinos e por sua pesquisa de movimento.

Com sua tradição centenária, o maracatu de baque virado é uma manifestação ligada ao culto dos Orixás. Mesmo não sendo um grupo religioso, reafirmamos nossa reverência às religiões afro-brasileiras, presentes nos trabalhos artísticos do grupo, como forma de promover ações anti racistas e de valorização da cultura popular brasileira.